terça-feira, 31 de janeiro de 2012

DETALHE

...

loirinhos
pelinhos

pro lado
virados

(deitado
mosaico)

pros outros
desejo

(desenho
dos braços)

...

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

AQUILES

O que carregam
em sacrifício
teus calcanhares
enegrecidos?

O que ressentem
tão rente ao piso
dos muitos pares
desassistidos?

O que pressentem
ao pé do ouvido?
(olvidos os lares
porque longínquos)

O que acarretam
do morticínio
- se do teu Hades
serão cativos?...

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

SAZONAL

Antes do fim das águas
já mostra esgotamento
a lavra da página
no seu preenchimento.

O seu estreitamento. O seu esvaziamento.
Quebrou-se o catavento (do vento das palavras).

Tempo parado parece. Mas acontece
do tempo escorrer sem entreter, e mal tecer
a teia leve que carrega o esquecimento.

[doutro modo:]

Tornou-se o rio de há pouco
fiapo de curso custoso;
entornou do leito exposto

o leite da cura (caldo de cálcio)
da sua arenosa fratura.

Vertido o líquido, partiu-se o pacto
entre o de fora e o por dentro - daquele

meio metro inteiro
malfeito que muito conteve...

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

CALMARIA

O barco descansa a água polida
- o casco na superfície da linha.

Rasa colheita de expectativas
- de realidades que se acaricia.

(a léguas dos portos
de réguas, confortos

de bússolas, astrolábios
dos baralhos, assobios

que apontem quaisquer destinos)

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

VISITANTES

Um gato preto.
Um passarinho.

Este, colado ao vidro
hermeticamente protegido
(do Cisco).

Aquele - nem te digo
(felino característico).

Um, fotografável
- átimo desdobradiço!

Outro, aligeirado
por descuidado atentivo
(do Cisco).

[andarilhos
fronteiriços
(sãos e salvos)
do domingo]

domingo, 22 de janeiro de 2012

SOLAR

Enfim o triste clima
suspende sua cortina
cinza;

e incontida
a luz multiplica
os prazeres da retina.

Momento de sacadas
debruçadas, de varandas
estiradas - das calçadas

revoadas

em brancas caminhadas...

sábado, 21 de janeiro de 2012

ARCAICA ADVERTÊNCIA

a contemporâneos amigos de modismos

Cintilas

sílabas
vírgulas
posturas.

Acentuas
palavrinhas

(de leituras
entrelinhas)

reticências...

Adubas
alturas:

- sígnicos
inchaços
(hieroglifos
estilizados)
[os sentidos
aos pedaços]...

Avistas
fortunas
(de escritos)
em vias.

Respiras
umbigos
(ainda).

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

THE CAPTAIN AND HIS NEIGHBORS

Mais um conde discursivo
entretendo passarinhos?

Não exatamente. Falo
que há de fato intimidade
mútua e ambivalente;
e inexatamente porque

orgânica, tão antiga
quanto lava incandescente:

- os milhões de anos de pressa
evolutiva da presa
que ao predador apreende
(vitima quem o confirma).

Cisco em copas balouçando
com ciscos outros andando

- rolinhas, pardais vis-à-vis
bem-te-vis; mudos calangos
roliços de muros, e anus
cosmopolitas; mil tizius
e batráquios sumidos; e

no horário, pintando o quadro
trinados joões-de-barro
treinados metálicos, plus
miniaturas redivivas
voando de inseticidas -

minha admiração fixa
por criações ressentidas
do instante - não obstante

sua beleza infinita...

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O VISITANTE

Pela tarde caída um pardo
gato sua visita anuncia.

Desmedido
à vontade
distraído parecia

no dorso dos muros
o corso de árvores
douto se exibia

ocioso
(quase gordo)
na verdade com preguiça...

Todavia
cauteloso no limite
(um gato, ouviste?)

talvez perigoso:

- tal seu silêncio
em movimento
insidioso...

[por via das dúvidas o capitão
do meu coração recolheu-se tácito
ao palácio da sua condição
de (ainda) filhote]

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

HUMANO

Um contato fortuito
presumido que seja
- pedaço de carinho
largado no caminho

que seja!... Que converta
esta humana esperança
que malgrado aconteça

em outra contradança
de minha natureza...

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

CASSINO

Que esportiva azia
domingo domina!...

Se perco perdendo
ganhando só empato

num match impotente
de bola pro mato;

o quão tenazmente
distorço o presente

(o jogo dos fatos)

me é indiferente:

- caio eliminado
e decidualmente

logo de uma chance
(uma extravagante)

fora do baralho;

descarte, descanso
(destarte o trabalho)

resíduo latente:

- até deu próximo
meu ótimo game...

domingo, 15 de janeiro de 2012

PALETÓ

Afeto ambíguo
o que dedico

seu fio escorre
contido um rio

(eu encoberto
decorro disso).

O quão inverno
será num terno

seu verão frio
dirá no cio

(porque decerto
se aquentar, tiro...).

Embora incerto
seja seu risco

inteiro ou meio
meu predileto:

- põe-se completo
pois não espero

(tal a virtude
da incompletude).

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

THE CAPTAIN CONQUERS THE TREES

Seis meses de idade
- a figura

seis metros de altura
- as árvores;

e Cisco the kitten
na sua aventura
aérea noturna

(etérea ventura
que se desconhece)

encontra, em suma
o seu evereste...

(seu primeiro teste)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

OUTRA DEFINIÇÃO

Clássico
- o que classifico.

(o resto
degredo perpétuo)

Clássico Calvino

conceitos e definições

"1. Os clássicos são aqueles livros dos quais, em geral, se ouve dizer: 'Estou relendo...' e nunca 'Estou lendo...'.
...

2. Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los.
...

3. Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual.
...

4. Toda releitura de um clássico é uma leitura de descoberta como a primeira.

5. Toda primeira leitura de um clássico é na realidade uma releitura.
...

6. Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer.
...

7. Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes).
...

8. Um clássico é uma obra que provoca incessantemente uma nuvem de discursos críticos sobre si, mas continuamente a repele para longe.
...

9. Os clássicos são livros que, quanto mais pensamos conhecer por ouvir dizer, quando são lidos de fato mais se revelam novos, inesperados, inéditos.
...

10. Chama-se de clássico um livro que se configura como equivalente do universo, à semelhança dos antigos talismãs.
...

11. O 'seu' clássico é aquele que não pode ser-lhe indiferente e que serve para definir a você próprio em relação e talvez em contraste com ele.
...

12. Um clássico é um livro que vem antes de outros clássicos; mas quem leu antes os outros e depois lê aquele reconhece logo o seu lugar na genealogia.
...

13. É clássico aquilo que tende a relegar as atualidades à posição de barulho de fundo, mas ao mesmo tempo não pode prescindir desse barulho de fundo.

14. É clássico aquilo que persiste como rumor mesmo onde predomina a atualidade mais incompatível."

Italo Calvino, Por que ler os clássicos. Tradução de Nilson Moulin. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, pp. 9-15.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

AO DIA CHUVOSO

Cinza alvorecido
(tão cedo cediço)
tardo-antecipado
pardo crepuscular

do passo trevoso
desferido angular

(sei que a contragosto)

choras, aziago
(meu olhar ao largo)
teu úmido desgosto;

e sensibilizado
face ao drama de outra face
simpatizo, e à janela
até solidarizo:

- mas a trama natural
de natureza reversa

(qual a minha, interna)

solicita, tal a depressão
a tua internação...

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

SÓ ISSO

A coisa do estar só
sua força, é só

a profundidade

do buraco necessário ao cimento
- seu concreto preenchimento.

A boa gestão do empreendimento
pede alicerçá-lo - o momento

com solilóquios extremos
(sólitos ao mesmo tempo)

de sorte que sólido se evite
o solipso revide
de um precoce empalhamento

- da vida que ainda falta
(lidas que andam em falta)

sem lamentos de escuridão.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

ESPETACULAR

Hoje somente
(quanto freqüente)

cedo o meu coração
cedo a lunar borrão

no veludo azul-escuro
guarnecendo o céu noturno.

(do lar no chão
do ar seguro
tartamudo
admiro)

SÍNTESE SEMIOLÓGICA

Da poesia contemporânea
que me apresentaram

- consentânea, segundo entendidos
da sua primeira importância

faço-me o leitor desentendido

distraído até - por ignorâncias
(entre elas, a das boas regras
de repleta convivência literária)

que me cabe. Parece-me, todavia
que ergueram significantes palácios

detalhadamente decorados com retalhos
de mais significantes, sobre outros
amontoados formando gigantes pormenorizados
ou seres por vezes recombinados com o fito
do efeito inesperado (do gosto surpreendido)...
significantes tão liberados ao ponto de
assintáticos já que fragmentados - embora
podendo-se rizomáticos; mas se ao contrário
monossilábicos sem parentes serão, quando não
caças-palavras em quebras-cabeças claramente
indiciais... ou então (a depender
de quão tácitos os radicais)
tatibitáticos neurais

numa imensa estrutura
(que não sei se se segura)

à custa de quaisquer significados:

- pobres escravos
insignificantes...

sábado, 7 de janeiro de 2012

THE CAPTAIN MEETS THE KING INSIDE

O grande predador
da média área de caça
do meu pequeno reino

- de rei sancho estranho
se quixotesco primeiro

investe contra moinhos
de fina brachiaria
cortando o vento ferino.

Plástico, cirúrgico
elástico opera o felino
noturnos com tal graça

- qual garça estilizada
na alongada elegância

que me talha a carne fraca
(por reiteradas distâncias)

ao relento, oportuno
da tarde enluarada...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

HUMANA SEJA

a Marion (de Asas do desejo, de Wenders)

Na lassa corda acima
de coisas pequeninas

um medo trapezista
engrossa a ventania;

recorda-nos o quanto

(escurecida a vida
pela variedade infinitiva dos enganos
de anjos e demônios)

somos breves pirilampos
sem aposentadoria...

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

DO INVÓLUCRO II

Tudo que consiste
no que em mim existe

percebo-o estreito

como se o sentisse
somente rarefeito

e apenas superfície
- risco em balão cheio:

- o quântico mistério
ao infinitésimo

(isso no que estreito
de desencontro ao peito).

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

NO HIATO CLIMÁTICO

Abriu-se hoje mais cedo
(aqui fora, ali dentro, lá...)
bem atípico janeiro:

- o cinza, desalojado
por vento limpo, ao deus-dará
no pico de sua estação

bateu-se por quase nada
(acaso, ocaso da atenção
o tiro pela culatra...)

e ainda na madrugada
sucumbiu - mas não tardará
a repintar firmamentos

(esta tarde, por exemplo).

***

Inda assim, livre o estio
da chuva por um momento

(a socorrer dois destinos
antecipando-se o tempo)

veio de abril um proveito
raro no mês de janeiro:

- depois da hora que aflora
luz que ora profana (o clima)

lavar sua própria perfídia

poderia (a consciência)
determinar a distância

de um malfadado silêncio
à sua decerta ânsia?...

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

DE VEZ EM JANEIRO

Às vezes, resvalo por um vão
entre placas tectônicas do cotidiano
- para onde, não.

(porque isso acontece
desaparece - em vão)

Profunda, quente-escura, a rachadura
(como a geológica correspondente)

revela da encoberta superfície
o que de casca nela sobrevive
- a vazão no limite;

e desacostuma, definidamente
da presente temperatura ambiente
este estar-bem magno que se fez idiota

e agora magma derrete - embora
por razões de emoções somente...

(o que entorna a fervura
 em fritura indigna de nota)

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

THE CAPTAIN, THE MICE

Por vezes ao acaso
me encontro no arcano

(neste caso, salvo engano)

em Cisco the kitten
e seus ratinhos de pano.

A cinética energia
prontamente transferida
do capitão ao seu bando

no espanto paralisa
a atenção em revista
do que seja o seu campo:

- graças ao staccato
gulosamente pleno
de cada movimento

guardando levezas
em caixinhas de surpresas
reabertas com encanto

(graça alcançável apenas
como poética notícia
de uma vida que inicia).

domingo, 1 de janeiro de 2012

PLÁCIDO DOMINGO

No extremo feriado

fechado mundo afora
à ponta revirada
caudatária do que vem

o que me resta ver, trato
sem alarde, abstraindo:

- faço café, rôo cookies integrais
- recolho cocô do kid Cisco
(já ressecado, nunca demais)

- extraio e-mails do brilho do screen
- me encanto restrito aos sites do bem

e após ler - o que nem está escrito
nos livros - por dever de compromisso

se o tempo desdobrar, escrevo isto...

(de sorte que de mortes - extravio)