quarta-feira, 28 de novembro de 2012

QUASE PLATÔNICA

Bem no fim de qualquer período
(quando concluído o determino)

- mas antes do ponto preciso
no qual tomado de vazio
I realize que irrealizo

nas nuvens um recanto lindo
sinto que me prometo - minto

bem no meio do que é finito
o meu mais-que-perfeito início...

PELA MADRUGADA

do descaminho até a aurora

Escuro o tecido
com que se cobre o céu dormindo.

Cobre um tal apuro
que liquefaz como monturo.

Na manhã seguinte
(ao despertar o que me exige)

cala-se o dormido
a lamentar o acontecido.

domingo, 25 de novembro de 2012

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

IMANENTE

A luz molhada
tarde neste azul

espelha, clara
seu desdém do sul

- do norte, leste
além de oestes;

do cardeal vento
papas e tempos

também dos anjos
e outros arranjos...

À luz olhada
basta azul-clara:

- basta que nada
dela distraia.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

DODÓI

Meu amor
resfriou-se;

tanta dor
enfiou-me

um ardor
(como se)
cuidador

desta atriz
por um triz...

ON THE ROAD

O que retrovisa no horizonte
insensível à experiência - monte

que ultrapassado se alonga em sombra
excedente de um período - soma

impossível do irreconhecido

presente desponta um desafio:

- dar o que poderia ter sido
como tido, desprendendo o fio

que se agulha toda vez aguilhão
quando retecido em recordação...

BRILHOSO

e opaco

Há um chuveiro do outro lado do vidro
da janela a que bem postado assisto.

Trata-se de chuveiro metálico
(será de plástico?). Limpo, prateado

brilhoso da chuva. Na conjuntura
parâmetro leste para as corujas;

e da perspectiva dos calangos
(além de sequer possível remanso)

mal passa de cascata desligada.

Um chuveiro, que envidraçado assisto
à janela, aquém do outro lado disso.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

NESTE INSTANTE

Escureceu o canto do olhar
de onde vem ruidoso um vento

úmido de lascar.
Daqui a pouco o tempo

desabará
meu intento

(único)

de airar.

TERRITORIAL

ser aonde estando

Neste ponto do ano
bate meu castanho
olhar provinciano

nas coisas que longe
riscam o horizonte

ainda mais pra onde...

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

DELE DONAS

às que amamos e nos abandonam

Pessoas boas vão
roedoras que são

doadoras
do coração.

(pessoas necessárias
à toa, porque várias
as qualidades boas
que desfalcarão diárias...)

[a culpa é da construção
culpa da arquitetura
da canção, partitura...]

Camundongas
sete-léguas
pernalongas
(umas éguas!)

que não dão trégua ao mundo
com posto amor ao fundo

falso do baú.

[invisível agora
embora pressentível
(embora tenha agora
essa presença horrível)]

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

EM NOVEMBRO

Silêncio novamente.
Agora alegremente

na hora que desfia
o tempo que chuvisca:

- da noite que se avista
(e nos abriga rente)

do feriado da gente...

terça-feira, 13 de novembro de 2012

FUTURO EM SILÊNCIO

sobre administrar o medo

O silêncio da tarde depois da chuva.
O silêncio que mais arde antes da chave
do futuro girar lenta de verdade.
O futuro como indício de uma luta.

O silêncio que fará depois da chuva
do futuro cair lenta de verdade.
O silêncio do que mais tarde ante à chave
no futuro vencerá entre quem luta.

O silêncio do futuro de quem luta
na verdade vingará antes da chave.
O futuro do silêncio de mais tarde.

O futuro do silêncio de uma luta
abrirá o que me arde depois da chuva.
O silêncio do futuro que me abate.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

LAMENTO CORPORAL

efeito de atletismo bissexto

Sob o azul enxaguado
primaveril do cerrado

numa segunda, o corpo dói.
Do excedido domingo, o herói

só tem ciência na segunda:
- justo a segunda, que inunda

com ininterrupta luz
essa consciência que as reduz...

sábado, 10 de novembro de 2012

CINQUENTA E TRÊS

Quando finalmente se acredita
que um tal dia enfim realizaria

o sossego íntimo prometido
mais divino antes do sacrifício

o que acontece? Põe-se um espelho
à frente do passo em que envelheço

e nele forçado a retroceder
('convidado', dizem, por escolher)

torno-me outro Sísifo de pedra:
- malucas a pessoa e a tarefa...

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

NA VÉSPERA

... eis a costura matinal
de pedaços da cabeça maldormida:

- solidão dos planos
saudades de antanho

os nervos de plantão
(fantasmas no salão)

um cinza de limbo
nas cores que abismo

e meu amor agorinha
pela chegada da aurora
(embora chuvosa).

***

[em casa, na rua, na praça
no artifício do condomínio

(encapsuladas em vida)
enregelo de paraíso!...]

***

[costura compreensiva
de centrípeta vontade

(urdida pelo alfaiate
daquela depressãozinha
delicada da barriga)]

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

MINHA CASA

projeto à deriva

Há fixo um ponto no universo
onde construo o meu castelo.

Na mente desde sempre
o eu-arquiteto o sente:

- de desejos com tijolos
à parede do momento;
dos ensejos mais ditosos
à frieza do cimento;
de prazos esperançosos
ao telhado do orçamento...

Existe um lugar no universo
que me antecede - e a este verso

(meu reflexo imanente)
que sobre aquele escrevo:

- um jogral que mal procede
se inteiro não se refere
a um espaço precedente
pedaço que não pertence...

(exceto àquele, diverso
que o eu-engenheiro mente)

***

[Sérgio Euclides, quem diria?
O teu pouso é (má) poesia!...]

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

CHARLES

a uma feliz posteridade

Leia, leia, leia, leia!
Peia, peia, peia, peia!...

Tua leitura - que salienta
a torpeza da tristeza

no alexandrino elegante
de um estilo querelante

cabula a alma sensível
para a beleza visível...

Qual é, Baudelaire? Século
e meio depois, crédulo

acho que nada - da prata
suja do tempo - separa

o escritor contemporâneo
de um seu leitor sucedâneo...

(ainda que o brilho original
perca-se nas cópias do mal;
ainda que o gênio seminal
chafurde-se colateral)

Charles - Édipo fajuto!
Com desvelo inauguraste
sete gerações de luto!

Charles - por que mui remaste
(contraditório contudo)
entre Perséfone e Hades?...

[mas que ventura passeia
pelo correio das artes
maledicente em novembros?]

[e qual desventura ondeia
a praia de monumentos
beneficente de Charles?...]

REENTRÂNCIA

frescura

Ontem, caí numa vala introspectiva.
Mas o que precisamente significa?

Que se trata de um buraco no caminho?
Que se trata de um movimento reflexivo?

Hoje, na vala continuo, até almoço
depois durmo - e à tarde, lanchar esse troço

introspectivo deverei. E quanto a responder
a questões operacionais de poder

lá pelo jantar, pela noite sem luar, a saber...

terça-feira, 6 de novembro de 2012

EU SEI

De onde viemos, meus sapatos?
Do passado patinando?
De um lugar longe no mato?
Ou somente estagnando?

Como estamos, por acaso?
Parados, nos aquecendo?
Na digestão de um descaso?
Ou simplesmente esquecendo?

Para onde iremos, de fato?
Ao destino presumindo?
A um futuro mais sensato?
Ou meramente fugindo?

Em quanto tempo, no caso?...

HIATO

Entre uma orelha e outra
(avançada a madrugada)

voadora, a mariposa
interna derrete a vela:

- é vácuo que desacerta
o pensado numa boa

marujo frente à procela
caramujo quente à toa...

[se voa
do fado
nevoa
de fato]

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

POR UMA ASPIRINA

contramonumento

Minha cabeça dói.
Rói a paciência...

Mas longe de Cabral

não moí ciência
(com tal excelência)

pra conjurar o mal.

sábado, 3 de novembro de 2012

DA IDADE III

Eu moro
num corpo
cansado
de morto.

Habito
um dorso
antigo
no modo
diário.

Um vário
dorido
de usado.

Remoto
ao trato.

Cinquentenário.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

CONSELHO VELHO

Sobre certas pulsões que acometem
sadios tecidos de relações:

- nada, nada mesmo que disserem
mapeará seguidas contradições...

(e muito, de tudo que omitissem
alimentaria tais vertigens)

[de maneira que evitá-las
(como a sede às cabaças
de pôr água envenenada)

pede presente o concurso
do juízo, mais o recurso
do sumiço (à parte os muros)]