segunda-feira, 31 de agosto de 2015

FACE A MEDIOCRIDADE

nenhuma honestidade

Toda vez que me sento
diante da tela, tento

(é assim que me apresento)

protegê-la do invento
centrípeto de um vento

(é assim que o represento)

que-interno-ocupa-o-hiato/vácuo-do-pensamento.

Desrespeito o momento
[o vazio do texto]

pretextando um evento?

Ou respeito o cinzento
intentado, a despeito?...

[qual mesmo o sentimento
de fraude em movimento?]

...

{diante da tela, avento}

domingo, 30 de agosto de 2015

DOMINGA III

À noite posso
dizer que nosso

amor de conto
labor perdura

no contraponto
da hora escura.

DOMINGA II

Tarde que cura
tarde, que dura

temperatura
de cozedura

até que murcha

(de sol, a lua)

DOMINGA

Manhã manhosa
(manha brilhosa)

esta que acorda
em mim agora

a fim de nada
que mais parada.

sábado, 29 de agosto de 2015

REVISITA 87: DIÁRIO (PUBLICADO) DE UMA PAIXÃO

12º poema de À procura de Nefertari

Em textos convertidos, vivemos
registros mal lembrados de tempos
quase esquecidos; dos papéis sumidos
às páginas soterradas milhares pelos anos;

porém, ao escrevermos e guardarmos
na memória dos recônditos armários
impressões das chaves que usamos
(cônscios vez ou outra de abri-los)

recordamos tanto a matéria-prima dos sonhos
quanto o barro modelado em feitos; o que somos
da construção de espaços há muito transitados.

[o grande livro da capa verde
sobre o longo rio em sofrimento
está pronto; ele não mais te pertence;
que então ganhe as ruas, e quantas mentes
libertem outras tantas, de todas as correntes
recentes do passado - oxalá triste pretérito
não mais presente, não mais devido]

{... e quão nobre missão a tua!
Reabrir justa, pelo mundo
teu recôndito coração puro!...}

10/04/2005

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

REVISITA 86: SUMA ASTROLÓGICA

11º poema de À procura de Nefertari

Acordei da névoa lusco-fusca
entre os olhos e a consciência;
e o véu anestésico dobrou escuro
o segundo gasto a ter certeza
afinal de tua existência.

O café, a música, a tela brilhosa
inseparáveis da manhã crepuscular
derramaram-se pelos cantos múltiplos
recontando, extáticos, as tuas estórias;
nestas antevi, sonolento embora, a tua vitória:

- a vitória óbvia do desejo sobre o medo
pelo teu horizonte inimigo dos cubículos;

- o predomínio das cores vivas sobre a cinza
dor recidiva; o triunfo dos afetos em flor
apenas por brotarem, testemunhas viças
do quão fértil és, em realidade e fantasias;

- a prevalência definitiva, sem mais idas
da inocência incontida dos propósitos
no espírito da tua herança adolescente;

- e na tua hora hoje adulta, algo retida
a escolha real dos impulsos, ora temperados
logo virá no molhar da camisa, a jogar a vida.

Por fim, a minha nobre, oportuna astrologia
dourando vespertina essa questão matutina
(no avançar inexorável deste lindo dia)
concedeu-me derradeiro o conhecimento
limpo - sem nuvens - do teu destino:

- nele um amor rendido, franco
plenamente correspondido
será coroado soberano.

09/04/2005

terça-feira, 25 de agosto de 2015

CECIL

ao espécime que o matou

O que se esconde
por trás dos montes

de um horizonte
sem brutamontes

ou caçadores insatisfeitos
a despeito de quase perfeitos?

Imaginemos:

- rinocerontes
brancos e negros?

- sigmodontes
por aqui mesmo?

- bichos com fronte
chifres/presas/pelos/penas/pontes

para as mil fontes do viver pleno?...

...

[imaginemos

retrocedendo: os eucariontes
antes do superior Pleistoceno]

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

NA MINHA CIDADE

todo fim de tarde

como toda arte
que outrossim nos arde

(como se avant-garde)

repete-se à parte

singularidade.

DOMINGO À NOITE

possibilidades

Todo fim de domingo

(do bom tempo, o respingo
que insistimos distinto)

desatina sentidos:

- é a pior hora de muitos
por calarem seus uivos;

- é a pletora de poucos
por ouvirem-se moucos;

- talvez a espora de outros
considerados loucos

[então nascidos potros
talvez crescendo lobos]

{senão nascidos outros
desenvolvendo os lobos}

sábado, 22 de agosto de 2015

SENSÍVEL II

O que o brilho do sol anima
(aponta, aquece, aporta, alia)

em sua diária travessia

se logo é tarde fugidia
em minha solitária ilha?

Por que, da solidária trilha
(de estrela que a tudo rebrilha)

presumem-no ser que ilumina
a toda e qualquer superfície

se pródigo, à noite desiste?...

[ainda que vença a madrugada
pontualmente, a cada jornada

o que ao brilho do sol resiste

em mim, se padece com nada]

REVISITA 85: LÓTUS

nono poema de À procura de Nefertari

Lótus. planta aquática (Nymphaea lotus), de folhas orbiculares, denteadas e belas, e grandes flores brancas, com pétalas externamente róseas e estames amarelos, nativa da África, especialmente do Egito, muito cultivada como ornamental, e pelos rizomas e sementes comestíveis; loto-sagrado-do-egito, lótus-sagrado-do-egito, nenúfar, ninféia.

Quero-me jardineiro
dos vasos aguadeiro
sob o sol do deserto
perto de ti, e amado.

Procuro-te, às margens do rio
sagrado; se do teu agrado
voltarei, caso não te encontre
no caminho da barca de Caronte.

Quero-te cultivar as flores
generosas; pois das piores dores
sofrem vidas sem a beleza
dos caprichos, vítimas da natureza.

Procuro-me, de corpo e alma
ao procurar-te, às margens do rio
sagrado; se bom jardineiro e aguadeiro
retornarás morena ninfa, alva Rainha!...

[quero jardins de vasos abaulados
vertendo calmos as águas distantes
que conosco vicejem, em instantes
róseas ninféias, nenúfares alados]

08/04/2005

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

QUADRA DE FORA

fora de casa

Aqui e agora
sofro que a hora

que o sono adora
sonho por ora...

REVISITA 84: DAS HORAS

oitavo poema de À procura de Nefertari

Esta manhã cedo amiga, ensolarada
antiga luz de arcos, flores de sacadas
clara coloriu crepúsculo pensamento:

- pintou de azul-puro o meu desejo
de andar contigo, as mãos dadas
bobas sorrindo pelas calçadas.

Quando o calor enfadou o dia, a tarde
encontrou-me contigo no interstício
do mais saudável, o quarto cochilo:

- quase acordados sonhando vagares
de largas asas levando-nos pelos ares
à insustentável jornada de que falaste.

Dali a noite invisível, opaca cegueira
introverteu-me cinestésico o espírito
para coisas mínimas que são tuas:

- finíssimas fraturas diminutas
dedilhando certeiras sílabas ligeiras
a varar agudas madrugada escura.

[quero-me seta e alvo, a escala do relógio
no espaço inteiro desse tempo a teu respeito]

08/04/2005

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

PEQUENEZES

aos cãezinhos de Luis Fernando Verissimo

Nossas certezas
intempestivas

nossas destrezas
inexpressivas

- na ventania
respectiva -

quando coincidem
impositivas

cheiram fuligem:

- pulverulentas
ferem as ventas

ao colidirem

poeira apenas.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

VICE-VERSARIA?

vela e parede, parede ou vela

Teu muro macio
dispensa o que eu digo.

Pura alvenaria
dispensa que eu diga.

Se há cura auditiva
dispensa que o diga...

[dispenso que o digas
(se então recíprocas);

dispenso o que alisas
(duras cantarias);

repenso armistícios
(se os urde 'bem-vindos')]

***

Teu muro maciço

me amura preciso
em duplo sentido.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

ANTES DO GELO

à cupidez tropical

Acima, o mundo é solar
mesmo na noite polar...

Abaixo, muito está no ar

arrebentando o colar
bestializando o falar

contaminando o pomar
envenenando o lagar

(submetendo o lugar
vitaminando o dólar)

degenerando polar...

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

REVISITA 83: POEMA TORTO DO AMOR SENSATO

sétimo poema de À procura de Nefertari

Tenho de falar do amor que me aluga
perplexo, andares inacessíveis de mim;
do meu amor-invólucro sobre as pernas

esguias dela - bípede passante, sem nexo
movendo incessante o cardíaco plexo
(que sonho, louco, daqui a pouco habitar)
de caminhante solitária das vias obstruídas.

Tenho de tratar do amor que me ocupa
carente das largas e verdes perspectivas;
faz-me doente dela a tristeza dos poemas

que escrevinha; ponteiros mal partidos
guias perdidas, lembranças desmemoriadas
de um tempo não vivido (como então lhe digo
que sou a vida, a verdade - o caminho?...).

Tenho de cuidar do amor que me inunda
de lágrimas virtualmente investidas, vertidas
pelas janelas semiabertas quando fecham

instantâneas, implacáveis no cerrado soslaio
das intenções, desconfiadas de atenções
(porque a cyber-dor que se realmente sente
deveras desmente-se na terra do nunca).

Tenho de amar o amor que me cura
definitivamente; há tanta sanidade oculta
debaixo das palavras, por cima das estrelas

das toalhas plásticas de mesa; e beleza
nas minúcias que o olho não capta da poeira
dourada de coisas corriqueiras, ordinárias

e mágicas - o limiar onde afinal te encontro...

07/04/2005

domingo, 16 de agosto de 2015

ZORRO, SOCORRO!...

retomar Sísifo, suponho

Quando não corro
domingo, eu morro

descendo o morro
caindo o forro

enquanto borro

minguando o jorro
sumindo o esporro...

[velho cachorro
bicho chinchorro!...]

sábado, 15 de agosto de 2015

REVISITA 82: OS FLUXOS DAS COISAS QUE ME CERCAM E CONSTITUEM...

sexto poema de À procura de Nefertari

... não apontam caminhos, saídas, redenções, outro ser derivado
das coisas que me cercam e constituem; o tempo, num momento
tudo paralisa, friamente convertido na expectativa
do ato à frente: mas qual tentar, se meus pés-troncos
lançaram grossos suas raízes?

Os fluxos das coisas que me cercam e constituem
não contemplam quedas definitivas nos abismos
do branco desespero; circulares, circulam-me
entre as coisas que me cercam e constituem
sem trégua, sem a régua-e-apontador
de uma infância guia.

Os fluxos das coisas que me cercam e constituem
não se abalam febris em reta direção à praia das imagens
abertas, mornas, areadas, arejadas que emancipam; eu queria
uma vez só as coisas que me cercam e constituem prisioneiras
de vontade incontrolável, avassaladora, torrente veloz e massiva
da sanguínea pressão alta de um homem livre.

Os fluxos das coisas que me cercam e constituem
não te incluem entre as coisas que me cercam e constituem
exceto como fantasia; sonho em sonos sem tratativas
com lugares e estares teus, espaços além de quaisquer visitas
do corpo; neles, projeto desdobrado meu largo interior desabitado
numa tapeçaria infinita: o chão aéreo dos teus etéreos passos

aquém do que é preciso.

05/04/2005

NO MUNDO DO TRABALHO

ilusões de aço

Eu caço

(mormaço)

eu laço

(cansaço)

eu faço

[bagaço]

eu passo...

{baraço}

...

eu _ (traço!)

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

REVISITA 81: DA SUPREMA SANIDADE

quinto poema de À procura de Nefertari

Toma a minha mão, venha comigo
calma a chegar algum lugar;
rir e chorar dos caos do mundo
achada e perdida de tudo
também posso - mas junto.

Durma aqui mesmo, de um jeito
que sinta no peito o teu rosto
profundo e sossegado de sonhos
anis; longe da fumaça branca
a não mais cobrir a estrada.

E acordada, faça da luta
dos corpos estranhos no cio
o prazer úmido, misterioso
insensatamente sadio
das secas almas desconhecido:

- a paz doce dos músculos vadios.

04/04/2005

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

REVISITA 80: LA SORCIÈRE

quarto poema de À procura de Nefertari

Fora, a noite cobre tudo que amanso
com seu manto estrelado de cabalas;
por dentro, a noite debate-se; e se tanto
em frente, a tela é frente - de batalhas!...

Luta amorosa, e doce, e tormentosa
por teus vários fragmentos; pelo entendimento

inteiro de ti vaporosa; da musa eletrônica
chave de todas as portas:

- dos portais daquele espaço há tempos
que noite embora (lida de ventos e cansaços)

[de escuros interiores e exteriores vastos]

{dos obscuros significados}

a manhã renova - e com ela, outros obstáculos;

... mas que um dia, numa hora
(marcada muito atrás por nossos ancestrais)
reunirá contemporâneos os pedaços

da menina-princesa de outrora

aos meus sonhos tão planos - de pisados;

e torto então, incompleto (completamente humano)
o cair imperfeito das peças no cotidiano
celebraremos - nas nuvens, como hiatos contando

o quebra-cabeças redentor do amor - a eterna cola.

02/04/2005

domingo, 9 de agosto de 2015

VAN HALEN 1978 II

punturas

Eddie - tua faca
aprimorada

[por meu tempo de escuta da estrada]

Alex, crava

Mike, agrava

Dave, abraça...

REVISITA 79: A MOÇA

terceiro poema de À procura de Nefertari

- em que rósea sacada
de almas tristes morada
vive a sofrer minha amada?

pergunto, vagando becos
até o fim dos tempos
só, sem termo.

- sob que lua ardente
tragando fogo recente
tomaste rota descrente?

questiono, distraindo dedos
com outras, enquanto meço
teu pressentir imenso:

- da feiticeira vítima
de bruxaria íntima
achada morta - e viva, a perfídia...

31/03/2005

VAN HALEN 1978

Neste sábado aprisionado

- cedo rosário de demandas
seculares e cotidianas

apequenando-me - são tantas!

Eddie, David e os rapazes
(será que fizeram as pazes?)

tocam ouvidos impudentes
(e nervos que adentro os espelhem)

de algum movimento que esquente
algum nó cego da corrente

deste passo domesticado.

***

Como de ontem foram capazes
(rookies, rockers especulares)

de vir tão espetaculares?...

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

PROBLEMA LÓGICO-POLÍTICO

para as vestais de plantão e os puros de ocasião
(além de nós e de vós)

A hipocrisia

(sua recidiva
reiterativa)

nos admira:

- por que seria?
- por que haveria?

[admitamos:]

1. A hipocrisia
é seletiva

- mas extensiva.

2. A hipocrisia
generaliza

- mas discrimina.

3. A hipocrisia
pormenoriza

sem empiria.

[e perguntemos:]

4. A hipocrisia

ética alia
se jurídica?

5. A primazia
da hipocrisia

reconcilia?...

terça-feira, 4 de agosto de 2015

PARA ALÉM DESTA CIVILIZAÇÃO

fora do lugar, 'bora pra Uranos!

O mundo - tal como o conheçamos
(talvez nem mais o reconheçamos)

desmorona - e vem acelerando
com solidez que o desconheçamos.

A despeito de estranho, entretanto
a carnavais e tais (por enquanto)

quiçá me reste e arraste, salvando
(desta cor que nos finge de brancos)

a minha pele o Cacique de Ramos:

- já que tem cinquenta e quatro anos

de inclusividade desfilando
de solidariedade sambando
de amor pela cidade sobrando

quem sabe abrigue um contemporâneo?...

REVISITA 78: VERSEJAR INGÊNUO

segundo poema de À procura de Nefertari

De um longo e fundo silêncio
hesitante entre ser outro (aí falante)
ou anônimo (irrelevante)
venho querendo assim, à espreita
embora escorreito
antes enfraquecido - agora decidido
mas sempre em movimento

te falar.

Declarar só o possível
o vivível rés ao chão:

- domínio da fruta depois do inseto
ao alcance das mãos;

- do halo seco de antes da relva
precipitar-se acima, verde-molhada
perfumada.

Contrastar os prazeres do alto
dos afazeres de baixo
em favor destes:

- porque daqueles não depende
o deleite dos sons, imagens
das texturas, paladares
os cheiros bons do mundo.

Sussurrar, e te convencer
a abraçar o risco do labor-viver
entre flores e abelhas:

- polinizando o tempo
de cores, e até desejando
de vez em quando
o aço dos ferrões;

- para que meu carinho curativo
enfim faça, de todo o fazer
o derradeiro sentido.

29/03/2005

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

O MACHADO DE ITAGUAÍ

no pescoço de alguém daqui

Neste momento da vida nacional

(além desta ficção individual
em que ínfimos nos situamos - na qual

cremos pios como a tal - vida real!)

um midiático Simão Bacamarte
opera de Curitiba, com arte

outra demão de Joseph McCarthy.

Para além do horizonte da experiência

no altiplano dos heróis da inconsciência
(pousada de clamores por decência!)

terceirizamos o que nos compete:

- consertar o que partido apetece.

domingo, 2 de agosto de 2015

REVISITA 77: MEDICINA PARA NÁUFRAGOS

primeiro poema de À procura de Nefertari, obra inédita

As vertigens do escolher são a paga
dos espíritos livres.

Embora acrófobo, sigo os teus passos
à procura das tuas mãos etéreas
(nervosas, ligeiras, elusivas: creio ainda firmes)
no fundo azul das telas;
fugaz, o teu ar rarefeito
sustenta nas alturas o granito pesado do meu medo.

As quelóides na alma são da saga
dos seres libertos.

Se virtual te rastreio o espaço
(hipertextualizando trilhas)
tropeço nos vestígios das batalhas
que travaste contra as fissuras
que te partem em duas, três, várias
doces criaturas.

A vida em pedaços vem da calha
do tempo repassando novidades.

Circunstancialmente atrasado
(ainda a relógios acorrentado)
contemplo o teu caminhar alto
fechando circular
(os dedos pelos pés, dos sonhos prenhe)
hic et nunc:

- o que cura neste lugar
e aos egos junta, agora
trago no descompasso
desta quase-hora.

27/03/2005

sábado, 1 de agosto de 2015